quarta-feira, 12 de julho de 2017

Você sabe a diferença entre educação e treinamento?

Existe, no mercado brasileiro, uma confusão muito grande entre os termos “educação” e “treinamento”. Já fiz esta pergunta para muitas turmas de MBA, e vejo que é difícil o entendimento correto da questão.
Fiel ao meu espírito de “velhinho metido a engraçadinho”, criei uma piada para ilustrar a resposta. A história é a seguinte; vamos supor que você tenha uma filha na faixa de dez anos de idade. Pois bem, um dia a sua filhinha chega em casa e diz que a escola vai começar a dar aulas de educação sexual. Entendo que, se você não for um ogro completo, vai gostar da ideia; afinal, vivemos em uma sociedade altamente erotizada, as crianças têm acesso a muito mais coisas do que antigamente, e a própria vida sexual começa bem mais cedo, portanto quanto mais informação melhor. É claro que você vai procurar se informar direito sobre o que vai ser proposto mas, de um modo geral, a ideia de educação sexual na escola é interessante. Agora imagine a sua querida filhinha chegando em casa e dizendo; papai, hoje estou muito cansada, tivemos um treinamento sexual na escola... Seguramente, não é uma perspectiva interessante, rsrsrs.
Piadinhas a parte, acho que é preciso deixar bem claro este ponto antes de qualquer discussão sobre o assunto. Escrevi recentemente um artigo sobre o “professor ideal” (ver ) e, entre os diversos comentários que recebi, alguns falavam sobre o problema da “interatividade”, ou seja, o aluno também precisa fazer a sua parte. E é exatamente aí que entendo que começa a divisão de águas entre a “educação” e um mero “treinamento”.
Procurando dar um exemplo prático da minha área específica, entendo que um curso de preparação para a certificação PMP é, tipicamente, um “treinamento”; o seu objetivo é passar na prova, e o curso vai ser direcionado para isto. É claro que sempre se aprende alguma coisa aplicável em outras situações, mas o objetivo maior é obter pontos no exame, e prá isto tome simulados e mais simulados. Já um curso de MBA me parece um exemplo típico de “educação”; não é apenas uma questão de transmitir conhecimentos aos alunos, mas sim fazer com que eles se tornem capazes de pensar e criar os seus próprios caminhos. É claro que isto é uma estrada de mão dupla; o melhor professor do mundo não vai colocar um aluno relapso para pensar, ao mesmo tempo em que não adianta o esforço do aluno se o professor não corresponder.
E é neste ponto que o aspecto da experiência do professor e sua capacidade de aceitar e incentivar a discussão em sala se torna muito relevante. Porque gerenciamento de projetos não é uma área que se presta a certezas “monolíticas”; assim como cada projeto é único e individual, cada situação pode ser abordada de várias formas, sem que exista uma única solução correta para que se aplique a todos os casos. O próprio PMBoK nunca se apresentou como uma “metodologia”, mas sim como uma fonte de “boas práticas”, ou seja, você não é obrigado a seguir tudo o que está ali, mas apenas escolher o que lhe parecer relevante para o seu projeto, e aplicar do seu jeito.
Já ouvi dizer que, nos cursos de MBA em algumas universidades americanas, existem aulas em que o professor não leva um material para exposição, apenas entra na sala e pergunta aos alunos; dentro do nosso tema (vamos supor que seja algo tipo “Gerenciamento de Riscos”), o que vocês querem discutir hoje? Pode ser que se trate de mera “lenda urbana”, mas acho a ideia fascinante. É claro que uma abordagem deste tipo exige um esforço muito maior do que o convencional, tanto de professores quanto de alunos, mas tenho certeza que levará a um resultado muito melhor. Usando outra de minhas piadinhas favoritas (realmente, eu sou um velhinho muito engraçadinho), costumo dizer que o processo de ensino e aprendizado, assim como o sexo e o vôlei de praia, é um jogo de dupla, e para obter bons resultados é necessário que um parceiro esteja sempre disposto a ajudar o outro (apenas para concluir a piadinha; é claro que tanto no sexo quanto no vôlei de praia existem os que gostam de colocar mais gente na quadra, mas isto foge ao escopo deste artigo, of course).
Tentando resumir tudo em uma frase só, eu diria que o treinamento te ajuda a aprender sobre história; a educação te torna capaz de mudar a história. E o que a gente mais precisa no Brasil de hoje são professores e alunos com vontade e capacidade para mudar a história.
Enfim, o tema é muito complexo e abrangente, não vai ser esgotado em um único artigo, mas gostaria, mais uma vez, de pedir o feedback dos amigos para esta questão.
Até a próxima.

domingo, 9 de julho de 2017

Em busca do professor ideal – o modelo CED (Conhecimento, Experiência, Didática)

Tivemos, há algum tempo no Linkedin, uma discussão interessante motivada por um questionamento levantado pelo meu amigo Américo Pinto, sobre a necessidade de um professor ter experiência no assunto que ensina. Algo do tipo; como alguém que nunca trabalhou em um projeto poderia dar aulas sobre o assunto? Como pesar os fatores experiência x conhecimento acadêmico (mestrado, doutorado) na hora de escolher um professor?
A pergunta, obviamente, não tem uma resposta objetiva. Meti a minha colher na discussão e propus um modelo semelhante ao CHA (Conhecimento, Habilidade, Atitude), que é aceito como o ideal para definir um bom profissional de gerenciamento de projetos. Minha proposta foi o CED (Conhecimento, Experiência, Didática), que definiria o professor ideal. Recebi comentários simpáticos à minha ideia, e outros nem tanto, mas acabei me sentindo encorajado a aprofundar o tema, que é a proposta central deste artigo.
Na verdade, este é um dilema que conheço desde a minha época de estudante universitário, na querida Escola de Engenharia da UFRGS, no início dos anos 1970. E lembro que sempre achei mais interessantes as aulas dos professores com vivência profissional do que dos “acadêmicos”. Usando os termos que foram popularizados na internet há pouco tempo atrás, achava muito melhor um engenheiro “de raiz” contando as suas histórias do que um “Nutella” enchendo o quadro-negro (quadro-negro? Meu Deus, como eu estou velho!) de equações.
Hoje, em um contexto completamente diferente, a discussão volta. Ao longo de mais de vinte anos dando aulas e assistindo cursos sobre gerenciamento de projetos, acabei desenvolvendo algumas convicções, que passo a expor agora.
O que seria o modelo CED (Conhecimento, Experiência, Didática)?
a) Conhecimento; Gerenciamento de projetos, seguramente, é uma área muito mais “empírica” do que “científica”. Em outras palavras, a construção do conhecimento na área de GP está muito mais atrelada ao acúmulo de experiências do que ao desenvolvimento acadêmico e científico. Desta forma entendo como altamente questionável a exigência de currículo acadêmico (tipo mestrado ou doutorado) para os professores desta área. Antes que alguém me tome como xiita do MSMsC (Movimento dos Sem Mestrado), uma vez que sou um deles, gostaria de esclarecer que considero o conhecimento acadêmico tão importante que resolvi começar um mestrado agora, aos 65 anos. Mas continuo sustentando que, para a área específica de gerenciamento de projetos (favor deixar isto bem claro) acho muito mais importante a vivência prática do que a acadêmica;
b) Experiência; sempre que ouço esta palavra lembro-me da definição de Aldous Huxley (“Experiência não é aquilo que aconteceu com você, mas sim o que você conseguiu aprender com isto”). Em outras palavras, podemos dizer que alguns velhos são experientes, outros apenas velhos. E a diferença está na vontade de aprender, de inovar, de se adaptar às novas realidades. A interação com os alunos é um ponto importante; acho sempre que o melhor professor é o que está disposto a aceitar ideias dos alunos e conduzir uma boa discussão com eles. Infelizmente, muitos ainda acham que são os donos da verdade (e posso afirmar, com toda a certeza do mundo, que com a idade isto só piora). Enfim, existe um “mix” ideal entre conhecimento e experiência. Mas nada disto funciona se não existir o “D”, que passamos a explicar abaixo;
c) Didática; O ponto mais importante de todos na hora de escolher um professor, pelo menos na minha visão, é a capacidade que ele tem de tornar a sua aula interessante e produtiva, que eu chamaria, genericamente, de “Didática”. Vejam bem, é muito importante, neste momento, saber distinguir “transmissão de conteúdo” de “stand-up comedy”. Conheço caras que são geniais como “animadores de plateia”, capazes de “energizar” os alunos com piadas, dinâmicas, jogos, mas, em termos de conteúdo passam muito pouco. Chamo isto de “efeito sabonete” – o cara faz espuma suficiente para encher a banheira toda, mas no final o que ficou de sólido é só uma barrinha deste tamanhinho. Por outro lado, existe o sujeito que sabe tudo, mas, como a água, é inodoro, insípido e incolor, e todo mundo dorme na aula dele. Obviamente o ideal é o equilíbrio – muito difícil de alcançar, seguramente.
Resumindo; o professor ideal teria doses equilibradas destas três qualidades. E nunca podemos esquecer que cursos são como projetos; cada um tem o seu contexto próprio e intransferível. Ou seja, dependendo da proposta do curso, cada uma delas vai ser mais ou menos importante.