quinta-feira, 1 de março de 2018

Reflexões sobre um aviso muito direto (ou; a triste história de um pastor de caranguejos)

A placa que ilustra este texto teria sido colocada por traficantes em uma favela do Rio de Janeiro. É um típico caso de “seria cômico, se não fosse trágico”. Seguramente os traficantes não estão preocupados com o meio ambiente, ou com a possibilidade do lixo acumulado produzir enchentes, estão apenas facilitando a organização dos seus negócios. E, conhecendo a indisciplina que caracteriza o brasileiro (e o carioca em especial), deixam bastante claro que, em caso de desobediência, o cara vai levar um tiro na mão. Nada muito violento (para os parâmetros deles, é claro), apenas uma lembrança para o resto da vida. Não é preciso dizer que a área está imaculadamente limpa.
Uma história puxa outra, e recordo o causo do japonês e do quebra-molas, que me foi contado por um amigo. Ele trabalhava em uma multinacional com sede no Japão. Um dia o “big boss” da empresa resolveu vir ao Rio de Janeiro conhecer a filial daqui, e coube a este meu amigo o trabalho de cicerone. O japa ficou hospedado no então Hotel Meridién, em Copacabana. De manhã cedo meu amigo passou por lá e foi levando o chefão para a fábrica, em Jacarepaguá. Como todos os estrangeiros que chegam pela primeira vez no Rio, o cara estava muito impressionado com as belezas da cidade, sempre maravilhosa.
O papo vinha tranquilo até que, próximo à fábrica, tiveram que reduzir a velocidade do carro para passar em um quebra-molas. Depois veio um segundo, um terceiro... até que o japonês não aguentou mais e perguntou porque colocavam aquilo no meio da rua. Meu amigo respondeu o óbvio; aquilo estava ali para obrigar os carros a reduzir a velocidade. Singelamente, o japonês perguntou se não era mais fácil colocar uma placa indicando a velocidade máxima. Neste momento meu amigo fingiu que não ouviu e tentou mudar de assunto. Como explicar o inexplicável?
O resumo da história é bastante triste, para nós todos; nenhum povo civilizado entende porque no Brasil as pessoas não conseguem ter o mínimo de disciplina, pensar o mínimo nos outros, obedecer às regras mais elementares. O reflexo deste comportamento nos nossos projetos é o absurdo aumento dos custos; é muito mais caro um quebra-molas do que uma placa, mas se ninguém obedece à placa... Esta desobediência obriga a controles pesados. E é por isto que temos leis complicadíssimas, fiscalização pesada, enfim, toda uma parafernália que se reflete em ineficiência e custos excessivos.
Lembro que uma vez, ao lidar com uma equipe extremamente rebelde, usei a expressão “pastor de caranguejos” para descrever o meu trabalho com eles. Eu me desgastava o tempo todo tentando levar adiante um projeto, enquanto cada um do time queria fazer do seu jeito. Se eu não consegui resolver o problema (e nenhum gerente no Brasil consegue, basta ver os nossos resultados), os traficantes deram um jeito bem objetivo; com um AR-15 na mão do gerente as pessoas subitamente se tornam educadas e dispostas a seguir as regras.
A pergunta é; será que tem que ser deste jeito? Talvez eu esteja viajando na maionese, mas me parece que o fato de uma percentagem significativa da população brasileira hoje apoiar ostensivamente a volta da ditadura militar tem a ver com isto. Particularmente, considero esta posição um retrocesso vergonhoso, mas o fato é que não aproveitamos os trinta anos de democracia que tivemos para aprender a debater com educação, conviver com civilidade e obedecer às regras. E quando o caos se instala, a quartelada aparece como uma solução. Quem não aprende por bem, acaba aprendendo por mal, já dizia a minha sábia avó, lá de Santa Maria da Boca do Monte.
Enfim, quem viver, verá.

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