terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Mais uma da série "meus pitacos no Linkedin" - gestão do conhecimento - parte 2

A discussão deste tema evoluiu, e eu acabei postando mais esta;

Pessoal;
Talvez eu esteja viajando para muito além da cidade de Mayonne, mas acho que chegamos a um ponto nesta discussão em que precisamos questionar os valores humanos de cada um. E vou arriscar alguns palpites no assunto.
Falei, em meu post anterior, sobre a diferença entre a visão imediatista e a de longo prazo. E a escolha entre as duas propostas (quero ganhar tudo hoje ou vou contribuir para que todos ganhem ao longo do tempo) passa por uma série de valores culturais do indivíduo e de seu grupo (seja empresa, país, time de futebol, ou o que for).
Costumo dizer em minhas aulas que o que diferencia um grande líder é o que chamo de “grande visão”. Citando os exemplos clássicos de Jesus Cristo, Mahatma Gandhi e Martin Luther King Jr (meus grandes heróis), sabemos que uma característica comum aos três é que todos foram brutalmente assassinados, ou seja, não viveram para ver a concretização de suas obras (projetos). E aí eu pergunto; valeu a pena? Se qualquer um deles escolhesse o conforto da visão de curto prazo, não iria bater de frente com o “status” da época – Cristo poderia ter sido carpinteiro, como seu pai, Gandhi um advogado de sucesso e Luther King um pastor de televisão. Mas eles resolveram ir além disto, ganhando, por um lado, o nosso reconhecimento eterno, mas pagando com suas próprias vidas.
E nós, como ficamos? Da mesma forma que eles, temos algumas opções. Podemos escolher a prostituição pura e simples (faço qualquer coisa, lícita ou não, desde que me paguem muito bem), a mediocridade com ética (não vou cometer crimes, mas faço apenas aquilo para o que estou sendo pago; se quiser mais, pague mais), ou o desprendimento (vou procurar fazer sempre o meu melhor, porque acredito que esta é a atitude certa, independente da remuneração que estou recebendo). É claro que estes são os extremos do espectro; todos nós buscamos o nosso ponto de equilíbrio em algum lugar entre estes pontos.
A gestão do conhecimento passa muito mais por esta visão cultural e humana do que por softwares ou coisa que o valia. Porque estamos falando em deixar alguma coisa para as gerações futuras, pela qual não seremos recompensados (pelo menos nesta vida – e aí podemos entrar em divagações maiores ainda). A simples atitude de compartilhar e discutir nossas idéias em um espaço virtual como este mostra que existe neste grupo a intenção de transmitir e acumular conhecimento, ainda que ninguém esteja ganhando para isto. Na mesma linha de raciocínio, penso que existem instituições (empresas, países, clubes de futebol) que, na visão de seus colaboradores (empregados, povo, torcedores) transcendem os meros interesses dos poderosos do momento. Procurando demonstrar minha tese com um exemplo bem chinfrim, eu posso dizer que nunca recebi um centavo para torcer pelo Grêmio; ao contrário, mesmo considerando que os dirigentes atuais não são lá estas coisas e que o time de hoje é medíocre, eu continuo comprando camisetas no site oficial, pagando o pay-per-view e, sempre que estou em Porto Alegre, procuro assistir a um jogo. Ou seja; por algum motivo, que passa muito longe da minha lógica de engenheiro, eu acredito que esta instituição merece que eu dedique a ela parte do meu tempo de folga e do meu rico dinheirinho, ganho com trabalho honesto. Talvez eu seja louco, mas, afinal, mais louco é quem me diz, que não é feliz (eu sou feliz)...
Resumindo; cada um de nós pode escolher o seu caminho. E ajudar o outro compartilhando o seu conhecimento (na medida em que isto é possível, é claro), é uma das opções.
Acho que viajei muito, desta vez...
Abraços e sucesso a todos

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Mais uma da série "meus pitacos no Linkedin" - gestão do conhecimento

Participo de alguns fóruns de discussão no LinkedIn, e um dos mais interessantes que surgiu nos últimos tempos foi o de gestão do conhecimento nas empresas. Mandei este pitaco para lá;
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Num raciocínio simplista (eu diria quase simplório), gestão do conhecimento seria a capacidade da organização de transmitir e consolidar o conhecimento dos funcionários mais experientes para os mais novos, assegurando que este conhecimento não será perdido com a inevitável saída destes funcionários mais antigos.
Sobre o assunto, gostaria de convidar o leitor para um raciocínio conjunto sobre como funcionaria esta troca e consolidação de conhecimentos em três tipos de organizações; na Máfia, em um grupo de artesanato tradicional (rendeiras, por exemplo) e na NASA. Como quarto exemplo, vamos pensar no que aconteceu com o conhecimento dos desenhistas de uma empresa de engenharia nos últimos trinta anos. Vamos lá;
a) Na Máfia, ou em qualquer organização criminosa, o “valor” mais importante da empresa é o respeito ao código de silêncio e a lealdade entre os criminosos. Ser impiedoso com os inimigos ou traidores também é um fator crítico de sucesso. Assim, é interessante notar que nestes tipos de organização, normalmente, a sucessão é familiar, ou seja; a “gestão do conhecimento” é feita dentro de casa. Ocasionalmente algum empregado da firma se destaca, e é admitido no grupo familiar. Também é interessante observar que, quando existe algum tipo de discordância entre os parentes, a coisa é resolvida rapidamente, pela eliminação física do grupo dissidente. Assim, podemos caracterizar este tipo de organização como “avesso a mudanças” (a forma de trabalho é rigorosamente a mesma, desde os tempos do Al Capone), e o conhecimento a ser transmitido restringe-se ao uso de novas armas e formas de violência mais criativas (a Máfia, por exemplo, jogava os traidores em um rio, com os pés presos em uma bacia de cimento; já os traficantes do Rio de Janeiro preferem usar o “microondas”. Variações sobre o tema).
b) Em grupos de artesanato tradicional, como as rendeiras do nordeste, por exemplo, o grande valor é exatamente fazer o trabalho da mesma maneira que era feito no tempo da vovó. O “diferencial competitivo” do produto é este. Portanto, a transmissão de conhecimentos também se faz dentro das famílias, de mãe para filha. A tecnologia fica fora desta história toda. O máximo de mudança que se observa é na forma de organização (hoje muita gente está partindo para o trabalho em cooperativas, ou ONGs), e na adaptação às sempre variáveis tendências da moda. Mas a transmissão e consolidação do conhecimento é rigorosamente a mesma há várias gerações.
c) A NASA é uma empresa de tecnologia de ponta, e altamente competitiva; assim sendo, inovar é para eles, uma necessidade de sobrevivência. Tive oportunidade de participar em um seminário sobre gestão do conhecimento com eles, em agosto/2002, e vi que o trabalho sobre este assunto é uma grande prioridade para a empresa. Fundamentalmente, eles consideram que o mais importante para que a coisa funcione, é a criação de uma cultura de transmissão de conhecimentos dentro da empresa. Em outras palavras, transmitir o conhecimento deve ser um “valor” para os funcionários. Para estimular esta atitude, eles ofereciam bônus em dinheiro, promoviam reuniões informais (chamados “story telling” – algo parecido com “contação de causos”), e tinham várias outras soluções bastante criativas.
O quarto exemplo que gostaria de trazer para a discussão é o que ocorreu com os desenhistas das empresas de engenharia nos últimos trinta anos. Quem, como é o meu caso, entrou no mercado de trabalho de engenharia nos anos 70, lembra perfeitamente que os “escritórios de engenharia” tinham diversas pranchetas, e, trabalhando nelas, cidadãos cuja função era desenhar as plantas das instalações. Os “conhecimentos e habilidades básicos” exigidos destes caras eram; mão firme, boa letra, e capacidade de visualizar a melhor solução para organizar o desenho. Seu trabalho era auxiliado por equipamentos como normógrafos, transferidores, compassos e mais um monte de coisas que hoje não fazem o menor sentido e, provavelmente, estão condenados a virar peças de museu, assim como aconteceu com as máquinas de escrever e as réguas de cálculo. O que quero dizer é que o avanço tecnológico, com a criação do CAD (Computer Aided Design), tornou obsoleto quase todo o conhecimento que os desenhistas transmitiam, de geração em geração.
As conclusões que eu consigo tirar de todas estas histórias são duas;
- Muito mais importante do que a mera transmissão de conhecimentos, é a transmissão dos valores e da cultura da empresa. Não é possível pensar em uma coisa dissociada da outra;
- Em alguns casos, o avanço tecnológico pode fazer com que o conhecimento envolvido em um tipo de trabalho mude de tal forma, que precisa ser “re-inventado” pela nova geração.
Para fechar, lembro um “causo” do genial Albert Einstein. Certa vez, ao ser perguntado sobre que armas ele achava que seriam usadas em uma hipotética terceira guerra mundial (não custa lembrar que estávamos nos anos 50, e a Segunda Guerra era um fato recente), Einstein respondeu; “Não sei que armas serão usadas na terceira guerra, mas a quarta, eu garanto, será com tacapes”.
Explicando melhor; a coisa mais importante a ser transmitida numa empresa, família ou país, são os valores. De nada adiantarão os avanços tecnológicos, se não conseguirmos resolver os nossos problemas de convivência. Se isto chegar a um ponto crítico, podemos acabar cumprindo a profecia de Einstein. E resolver tudo na porrada, exatamente como os nossos ancestrais mais remotos.
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Abraços e até a próxima!