terça-feira, 16 de janeiro de 2018

Viajando na maionese – como uma inocente piadinha pode nos levar a uma reflexão pesada sobre projetos, crenças e resultados

Entre muitas mudanças significativas que a sociedade viveu a partir da segunda metade do século XX, uma das mais profundas foi a chamada revolução da sexualidade. É incrível verificar que, há pouco mais de meio século, vivíamos em um mundo em que as moças “de família” casavam virgens, não havia divórcio, o homossexualismo era visto como uma aberração e otras cositas más. No novo contexto da liberação sexual, o ser humano literalmente se lambuzou, e surgiu a piada (com certo fundo de verdade, como ocorre com todas as boas piadas) de que os investimentos na área médica estavam sendo direcionados muito mais para a correção de disfunção erétil dos homens e melhoria estética das mulheres do que para a cura do mal de Alzheimer, por exemplo. O que levava à conclusão que, em alguns anos, teríamos uma geração em que os velhinhos teriam o pinto duro, as velhinhas os peitos e glúteos firmes, mas ninguém mais saberia prá que serve isto tudo. Hahaha.
Por incrível que possa parecer, esta inocente piadinha pode nos levar a reflexões bem mais profundas. Afinal, conforme digo sempre, projeto significa investir hoje para receber amanhã. E isto é o que torna o gerenciamento de projetos tão difícil; afinal, você tem que convencer a equipe, o cliente e todos os stakeholders que o sofrimento que estamos passando hoje vai valer a pena. Isto vale para qualquer projeto, desde a reforma do banheiro de casa até a construção de uma plataforma de petróleo. Matematicamente é o tal de VPL, mas, na vida real, a coisa é bem mais complicada.
E é justamente nesta hora que a cultura e as crenças se tornam importantes. A piadinha acima resume uma crença; é preferível aumentar o prazer sexual que se preocupar com o futuro do cérebro. Se levarmos esta reflexão adiante, esta é uma visão hedonista; satisfação agora, e o futuro que se exploda, ou seja, exatamente o inverso da receita do projeto de sucesso. Talvez isto ajude a entender o fracasso de quase todos os grandes projetos brasileiros; não estamos preocupados com o longo prazo, todo mundo quer é se divertir agora. Para quem gosta de contextos históricos, esta crença deve ter sido herdada dos desterrados que vinham para cá com o objetivo de encher os bolsos e arrumar um jeito de voltar para Portugal. Bem diferente da colonização americana, por exemplo, liderada por famílias que sofriam perseguições religiosas e atravessaram o oceano para construir um novo país. É uma explicação simplória para a diferença de nível entre os dois países (que têm mais ou menos a mesma idade), mas não deixa de ter sentido.
Trazendo toda esta historia para um “case” que eu conheço bem demais, acho realmente impressionante que algumas pessoas atribuam os problemas que a Petrobras atravessa hoje aos seus gestores atuais. Numa empresa do tamanho da Petrobras, posso garantir para vocês, as decisões levam sempre algum tempo até se refletirem em fatos reais. É a velha diferença entre dirigir um transatlântico e uma lancha. Citando alguns exemplos que eu vivi lá dentro (onde trabalhei de 1976 até 2014), a liderança que a empresa alcançou em tecnologia offshore no início dos anos 2000 começou com um forte programa de capacitação implantado ainda na época dos militares, no final dos anos 70; já os desastres e vazamentos catastróficos que estouraram na mão de Reichstul, no final do século XX (REPAR, baía da Guanabara, afundamento da P-36), foram fruto de uma política suicida de redução de custos que começou nos governos Sarney e Collor. Hoje, a empresa vive a ressaca de uma política igualmente suicida de investimentos em projetos conduzidos num viés totalmente político, que levaram o endividamento a níveis estratosféricos e não deram retorno algum (como o COMPERJ, onde foram enterrados cerca de 15 bilhões de reais). Num contexto muito semelhante, as décadas perdidas de 80 e 90 do século passado foram geradas por decisões erradas da ditadura militar, principalmente em função dos choques de petróleo (quando muitos dos que hoje criticam Lula só faltaram dizer que aquilo era “uma marolinha”...).
Resumindo, o que temos no Brasil, desde sempre, independente de quem ocupe o poder, é esta característica cultural de maximizar o hoje e esquecer o amanhã. Fazendo uma frase, eu diria que o Brasil vai ser o País do futuro no dia em que a gente resolver pensar seriamente no futuro. Ou algo parecido. A reforma da Previdência é um bom exemplo; salta aos olhos a necessidade de implementar este projeto, o mundo inteiro já fez, só que na terra brasilis ninguém quer abrir mão do que tem hoje. É óbvio que quando o barco afundar vai sobrar prá todo mundo, mas alguém está preocupado com isto? Afinal, carnaval está chegando e... vida que segue.

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